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Marcelo Teixeira

Sobre ética e estética religiosa

Marcelo Teixeira

 

 

            “Somos budistas por uma questão ética ou estética?”

 

          A pergunta acima cala fundo no artigo intitulado “Budista de direita é fajuto”, assinado por Eduardo Pinheiro, professor de filosofia da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UFRGS) e também sacerdote budista. Como tal, aliás, ele assina Padma Dorje, e é assim que irei me referir a ele.

 

            No citado artigo, Dorje afirma que, no Brasil, onde o budismo se popularizou de umas décadas para cá, é comum vermos pessoas crerem ser budistas só porque praticam a meditação. Segundo ele, isso seria uma visão rasa da doutrina fundada por Sidarta Gautama – o Buda –, que prega a justiça social, a espiritualização do ser e o amor a todas as criaturas (animais, plantas e pessoas). De nada adiantaria, portanto, se dizer budista porque medita e incentivar a competição e o individualismo; achar que consumo e projeção social trazem felicidade; ser indiferente à questão ambiental; achar normal que haja desigualdade social; ter uma postura preconceituosa em relação às ditas minorias: ser a favor da supressão de direitos trabalhistas etc. Padma observa, então, que, em nosso país, há muitos budistas da boca para fora. Budistas não por uma questão ética, mas somente estética.

 

            As considerações do professor gaúcho não valem somente para os budistas. Servem para os profitentes de qualquer religião. Por isso, convém perguntar: somos católicos, evangélicos, kardecistas, umbandistas, judeus, candomblecistas e similares por uma questão ética ou estética? Frequentamos os templos religiosos porque queremos nos melhorar como pessoas e, por conseguinte, o meio social ou queremos apenas arranjar um amor, promover o próprio negócio, garantir proteção ou obter favores espirituais? E como temos visto muitos rompantes de conservadorismo e flertes com o autoritarismo em várias correntes religiosas cristãs, é mais que oportuno indagar por que locais que deveriam primar pelo acolhimento, empatia e tolerância se transformaram em templos que incentivam o ódio, a competitividade, o preconceito religioso, o machismo, a homofobia, a transfobia, o racismo e até o armamento da população. Locais que colocam o dinheiro acima de tudo e solapam as economias dos incautos fieis enquanto os respectivos líderes religiosos vivem no conforto e na opulência, ao mesmo tempo em que erguem impérios de comunicação (emissoras de rádio e TV, promoção de cantores da área etc.) visando, inclusive, dominação das esferas políticas, seja em âmbito municipal, estadual e federal.

 

            No rastro dessa escalada monetária rumo ao poder, pipocam denúncias de estupro, sedução de menores, depredação de templos de profitentes de outras denominações religiosas (principalmente as de matriz africana), conluios com grupos criminosos... Enfim, a lista é longa e triste de ser detalhada, pois evidencia o quanto o ser humano deturpa mensagens de amor e concórdia para tirar proveito e impor seu talante de crueldade e submissão.

 

            Concentro-me nos pressupostos cristãos e ressalto que, em O Novo Testamento, Jesus Cristo chama atenção, em diversos trechos, para a necessidade de sermos éticos, íntegros e agirmos de forma coerente com o que acreditamos e pregamos. Em Mateus, 6:24, ele salienta que não devemos servir a Deus e a Mamon, termo utilizado para descrever riqueza e cobiça. Não há como servir a Deus e, ao mesmo tempo, ser escravo do consumo, achar que racismo é vitimização ou defender os interesses do mercado financeiro em detrimento do povo. Também no Evangelho de Mateus, mas em 5:37, o Cristo ressalta que nosso falar tem de ser sim, sim; não, não, isto é, não há como pregar uma coisa e fazer outra. Não é o que temos visto, infelizmente.

 

            Estas duas passagens bíblicas advertem que, se nossa base religiosa não é bem alicerçada, estamos em desacordo com o que a mensagem cristã prega. E se aproveitamos o púlpito para semear o ódio, a competição, o fanatismo e o preconceito, entre outras diatribes, é sinal de que a religião, no Brasil, está bem adoecida.

 


Nota: os conceitos de direita e esquerda remontam à época da França de Luiz XIV e sucessores. Do lado esquerdo do rei, ficavam os parlamentares que defendiam os direitos dos menos favorecidos. Do lado direito, os defensores dos banqueiros e aristocratas. Convém ressaltar, todavia, que a direita e a esquerda dos países europeus nem sempre são similares entre si e são bem diferentes do que testemunhamos nas congêneres brasileiras. Ressalto, ainda, que devemos ter cuidado tanto com governos de extrema-direita (saímos de um em 2022) como de extrema-esquerda. Radicalismos nunca são bons. Para mais esclarecimentos, recomendo a leitura do artigo do Padma Dorje. Link a seguir.

 

1- DORJE, Padma – Budista de direita é fajuto. Disponível em: https://tzal.org/budista-de-direita-e-fajuto/#:

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