Sempre gostei de programas televisivos de perguntas e respostas sobre conhecimentos gerais – os chamados “quiz shows”. Vibro quando alguém ganha uma boa quantia em dinheiro, fico chateado quando um bom candidato perde o prêmio devido a uma resposta errada e acho graça ou fico com pena das pessoas que não sabem coisas óbvias. Neste último quesito, confesso que costumo também ficar irritado.
É gritante a falta de memória histórica e cultural geral do brasileiro, fruto de uma educação precária que não prima pelo amor ao conhecimento e se limita a um ensino pouco aprofundado, que visa formar mão de obra barata a ser explorada pelas classes dominantes, esta também comumente vítima do mesmo tipo de educação, só que nas escolas particulares.
Saindo do universo dos programas de TV e indo para as redes sociais, já me deparei com episódios constrangedores produzidos por donos de alguns perfis. Eles saem às ruas e fazem perguntas fáceis sobre história e geografia, por exemplo, para o povo. Só que as respostas (ou ausência delas) costumam doer.
Em alguma cidade do Sul, mais precisamente um local repleto de moças loiras com tiaras de flores nos cabelos, o titular de um perfil no Instagram perguntou: “Em que continente fica o Egito?”. Vieram várias negativas, ou seja, não sabiam onde ficava o país das pirâmides e esfinges. A primeira pessoa que se arriscou a responder, disse, um tanto titubeante: “Não sei. Na Europa?”. Houve a segunda, também respondida na interrogativa: “Na Ásia?”. E também a terceira: “Na Índia?”. Por fim, uma jovem senhora, com os trajes típicos da região, disse, num sorriso sem graça, que não conhecia nada. Nem ela nem nenhum de seus concidadãos, pelo visto. Afinal, o Egito fica na África. Não na Europa ou Ásia, que são outros continentes, e muito menos na Índia, que é um país. Aliás, por falar em África, já vi gente jovem se enrolando toda por não saber enumerar cinco países nela localizados. Houve até quem não soubesse que a África é um continente.
O mais recente a que assisti me deixou estupefato. A pergunta da vez era a seguinte: “Quem libertou os escravos?”. Primeiramente, duas moças que caminhavam juntas tiveram de responder. A primeira não sabia e ainda reclamou do grau de dificuldade da questão (oi?). A segunda, que se declarou professora, também não sabia. O repórter, então, indagou: “Mas você não é professora?”. Sou – disse ela –, mas da educação infantil. Ah, bom – pensei eu – então, está perdoada (só que não). Veio a terceira entrevistada com uma resposta que foi um verdadeiro gol contra: Pelé. O entrevistador perguntou por que, segundo ela, Pelé libertou os escravos. A moça respondeu: “Ué, ele evitou uma guerra (qual será?), pode muito bem ter libertado os escravos”. Por fim, afugentando qualquer laivo de bom senso que pudesse restar à sabatina, uma entrevistada respondeu que quem libertou os escravos foi Chico Xavier, o médium mineiro. Fico pensando de onde ela tirou essa informação.
Oficialmente falando, quem libertou os escravos foi a Princesa Isabel, filha de D. Pedro II. Mas há controvérsias. Afinal, hoje se sabe que a Lei Áurea atendeu mais aos interesses dos latifundiários de então, já que não houve reforma agrária ou qualquer reparação social e histórica que desse dignidade à população negra. As consequências vagam por aí até hoje. O povo negro e seus expoentes (Luís Gama, Carolina Maria de Jesus etc.) é que foi se libertando ao longo do tempo.
Para terminar e para não dizerem que estou implicando com o pessoal que é abordado nas ruas, deixo claro que, em eventos como seminários e palestras em universidades e centros culturais, já vi muitos profissionais de nível superior abrirem arquivos de “power point” repletos de erros de português ou falarem bobagens como “Ele interviu” em vez de “Ele interveio”. E já vi um sujeito que, ao falar da fundação da Igreja Anglicana, trocou Henrique VIII (o fundador) por Henrique VI. Provavelmente, ele se atrapalhou com os algarismos romanos.
Os degraus da base da escadaria estão fazendo uma grande falta para os que tentam subir e não conseguem e para os que já subiram, mas, na verdade, estão precisando de reparos urgentes.
Marcelo Teixeira
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