A Superficialidade no Combate à Obesidade no Rio
A última promessa do prefeito Eduardo Paes, candidato à reeleição no Rio de Janeiro pelo PSD, causou alvoroço. Em tom descontraído, Paes anunciou a distribuição do medicamento Ozempic na rede pública de saúde para ajudar os cariocas a perderem peso. Ele mesmo relatou que o "remedinho" o fez perder 30 quilos e vislumbra um futuro onde o Rio “não vai ter mais gordinho”. Uma fala que, por mais simplista e até cômica que pareça, esconde a profundidade de um problema de saúde pública muito mais sério.
A promessa de distribuir o Ozempic, um medicamento originalmente utilizado para tratar diabetes tipo 2, desperta questões que vão além da estética ou do alívio das taxas sanguíneas que o próprio Paes diz ter conseguido melhorar. Obesidade é uma questão estrutural e multifacetada, afetada por fatores sociais, econômicos e psicológicos. Tratar um tema tão complexo como se fosse resolvível com uma "injeção milagrosa" desvia a atenção do real problema: a falta de políticas públicas eficazes e de um debate responsável sobre saúde no Brasil.
A obesidade é um dos maiores desafios de saúde pública do país. Segundo o Ministério da Saúde, mais de 60% da população brasileira está com sobrepeso, e cerca de 20% é considerada obesa. No Rio, esse número é alarmante, especialmente nas comunidades mais carentes, onde o acesso à alimentação saudável é um privilégio distante e o sedentarismo, muitas vezes, uma consequência da falta de espaços públicos adequados para atividades físicas.
A solução para esse problema não pode se basear em um medicamento que, embora eficaz em alguns casos, carrega riscos quando utilizado de forma indiscriminada. A Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) já alertou que o uso do Ozempic para fins estéticos deve ser desencorajado, já que, além de estigmatizar quem precisa do remédio por razões médicas, expõe outras pessoas a possíveis efeitos colaterais. Mais do que um “remedinho”, o Ozempic custa, em média, R$ 1 mil por unidade e sua distribuição na rede pública demandaria um investimento pesado, enquanto questões estruturais seguem sem resposta.
É irônico que, em uma cidade com enormes desigualdades, onde tantas pessoas sequer conseguem ter três refeições diárias garantidas, a prioridade seja distribuir um medicamento para emagrecer. Essa promessa soa vazia quando consideramos que o acesso à saúde de qualidade, que vai desde a educação alimentar até o incentivo à prática de exercícios físicos, é uma realidade distante para grande parte dos cariocas.
A história do Brasil é marcada por promessas de soluções milagrosas, que, na prática, pouco alteram a estrutura do país. Eduardo Paes, com sua promessa de "acabar com os gordinhos", parece repetir esse ciclo, tratando sintomas, mas não a raiz dos problemas. A obesidade, assim como tantas outras questões de saúde pública, exige políticas muito mais complexas e inclusivas do que um simples medicamento.
O desafio é grande, e a solução passa, sim, por campanhas educativas, acesso a alimentos saudáveis, incentivo à prática de esportes e uma melhoria global nas condições de vida da população. Afinal, a saúde não é só estética, e o bem-estar do povo carioca depende de muito mais do que uma promessa de campanha e uma "injeção mágica".
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