Entre as lições que o Brasil esqueceu de ensinar, a educação antirracista ocupa o quadro negro do descaso
Imagine uma sala de aula brasileira, com suas carteiras rangendo sob o peso de uma história que raramente é contada por inteiro. Ali, entre as páginas de um livro didático que celebra heróis brancos e silencia vozes negras, está o reflexo de um país que insiste em fingir que a desigualdade racial é um acidente, e não um projeto deliberado. O que falta para a educação antirracista sair das rodas de debate acadêmico e entrar de vez nas escolas?
Admiravelmente, a resposta está longe de ser consenso. Dados recentes do IBGE mostram que 56,2% da população brasileira se identifica como negra ou parda, mas as diretrizes curriculares ainda são tímidas na abordagem do racismo estrutural. E isso não é coincidência. Qual seria o real motivo para o incômodo de algumas elites ao tratar do tema? Medo de que as crianças aprendam que a abolição foi uma farsa sem reparação ou de que a desigualdade é mantida por conveniência?
O silêncio, nesse caso, é tão político quanto as palavras. Em vez de livros que ensinem sobre Zumbi, Dandara ou a importância das religiões de matriz africana, muitas escolas preferem neutralizar o debate, alegando que “política não entra aqui”. Mas, convenhamos: qual narrativa histórica não é política? Fingir neutralidade é, em si, uma escolha que perpetua a exclusão.
E os governos? Bem, os que se dizem progressistas parecem mais preocupados em transformar o antirracismo em bandeira eleitoral do que em implementar mudanças reais. Do outro lado, quem se opõe à pauta usa o velho discurso da “doutrinação” para travar qualquer avanço. O resultado? Uma geração que continua aprendendo a aplaudir uma falsa democracia racial, enquanto ignora que o preconceito permeia desde as oportunidades de emprego até os corredores do shopping.
A boa notícia é que a sociedade civil não está em silêncio. Projetos independentes, ONGs e coletivos têm feito o que o Estado se recusa: levar uma educação antirracista às periferias, às redes sociais e às rodas de conversa. O problema é que, sem apoio governamental, esses esforços são como remendos em uma ferida aberta. Quanto tempo mais vamos terceirizar essa responsabilidade?
O Brasil, tão pródigo em reinventar sua história para mascarar suas cicatrizes, precisa olhar para si com mais honestidade. Talvez a pergunta a se fazer não seja "por que o racismo ainda existe?", mas "quem se beneficia com a sua continuidade?" Afinal, o silêncio não educa. Ele perpetua. E, como diria aquela velha frase de corredor de escola: quem cala, consente.
Comments