
A bela canção “Ser, fazer e acontecer”, da autoria de Gonzaguinha (1945-1991) é um libelo pela libertação da mulher das amarras machistas. Composta no inicio da década de 80 do século passado, ela emocionou muitas mulheres à época e até hoje ecoa como um grito a favor da luta feminina por autonomia, liberdade, participação social, entre outras bandeiras.
A letra, que fez, por exemplo, a jornalista Marília Gabriela chorar copiosamente quando foi lançada, diz o seguinte:
Que uma mulher pode nunca nadaIsto eu já sei
É o grito da dona moralTodo dia no ouvido da gente
É que eu estou pela vida na luta
Eu também sei
E meu caminho eu faço
Nem quero saber que me digam dessa lei
Porque já sofri, já chorei, já amei
Vou sofrer, vou chorar e voltar a amar
Porque já dormi, já sonhei e acordei
E vou dormir, vou sonhar, pois eu nunca cansei
É que sinto exatamente
Aquilo que sente qualquer um que respira
Uma perna de calça
Não dá mais direito a ninguém
De transar o que seja viver
E por isso eu prossigo e quero
E grito no ouvido dessa tal de dona moral
Que uma mulher pode nunca é deixar
De ser, fazer e acontecer
Passados mais de 40 anos de seu lançamento e no mês em que comemoramos o Dia Internacional da Mulher, julgo pertinente mostrar como a canção de Gonzaguinha permanece atual e como as lutas das mulheres são também de todos os homens. Afinal, queremos trilhar nossos caminhos de forma independente e não queremos saber que a dona moral venha ditar regras para quem veste calças desde que nasceu e também para quem veste saias, tops, biquínis etc.
Mulheres continuam sendo vítimas de estupros e feminicídios. Estão aí os casos que a mídia mostra todos os dias e que convém não detalhar neste breve artigo. São, contudo, fatos que mostram como os homens não são preparados para lidar com as vitórias que as mulheres vêm conquistando ao longo das últimas décadas.
O sexo masculino, é bom frisar, não é educado para servir, mas para ser servido. Por isso, costuma reagir mal quando, por exemplo, ouve da moça uma resposta negativa ante uma abordagem ou quando a companheira decide terminar o relacionamento. Soma-se a isso, a herança escravagista, que faz com que o menino seja tratado como um pequeno príncipe ou senhor de engenho cercado de serviçais femininas (popularmente conhecidas como mães e avós) prontas para pendurar a toalha dele após o banho, lavar o prato que ele largou sujo à mesa, apagar a luz que ele acendeu etc.
Aí, surgem a revolução sexual e o movimento feminista e põem abaixo toda uma estrutura que colocava o homem como sol e a mulher como mero satélite. Resultado: pernas de calça que vêm perdendo o direito exclusivo de transar o que seja viver, como diz Gonzaguinha.
Por isso, em mais um Dia Internacional da Mulher, é preciso reafirmar que elas estão cada vez mais aí, prontas para ser, fazer e acontecer. Os homens que ainda não perceberam isso precisam acordar, tomar tenência e mudar. Afinal, será bem melhor se todos nós, juntos, sermos, fazermos e acontecermos rumos a dias melhores.
Marcelo Teixeira
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