Redação aborda raízes do Brasil que pedem reconhecimento urgente
Para os estudantes do ensino médio que enfrentam a maratona do Enem, este domingo trouxe um tema tão importante quanto essencial: "Desafios para a valorização da herança africana no Brasil". A escolha de um tema como esse é um grande acerto do Inep, segundo especialistas e educadores, pois não apenas examina as habilidades dos alunos, mas também coloca um holofote sobre uma pauta que ainda merece atenção e engajamento no Brasil. E como toda boa temática do Enem, esta redação pode levar a uma conversa nacional, instigando discussões profundas e necessárias.
Falamos com Juliana Rettich, coordenadora e professora de redação do PB Colégio e Curso, que destacou o caráter pedagógico da proposta. Para ela, discutir a herança africana é reconhecer as bases culturais e sociais sobre as quais o Brasil foi construído. Juliana ressalta que há três grandes matrizes culturais no país – indígena, africana e europeia –, mas que a influência africana ainda é marcada por um processo de "colonialidade". É como se, até hoje, houvesse um esforço para subalternizar o conhecimento e a cultura que vieram do continente africano, perpetuando um racismo estrutural que permanece nas entranhas da sociedade.
O tema nos lembra da Lei 10.639, de 2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas. Ainda assim, o avanço tem sido lento, seja pela falta de materiais didáticos adequados ou pela formação de professores capacitados para tratar desse conteúdo com a profundidade que ele merece. E é aí que entra um dos principais desafios: combater o “epistemicídio”, ou seja, o apagamento sistemático do conhecimento e da história dos povos africanos e afrodiaspóricos. Esse é um ponto-chave para a professora Juliana: “Esse apagamento mantém a inferiorização dos povos de África no imaginário social, o que, por sua vez, perpetua o racismo”.
O caminho para a valorização efetiva da herança africana no Brasil passa também pelo reconhecimento de que a cultura africana não se resume à escravidão, uma visão reducionista e limitante. A África é o berço da humanidade, e suas contribuições são inestimáveis, da filosofia à medicina. Como o fotógrafo Januário Garcia sempre frisava, "existe uma história do negro sem o Brasil, mas não existe uma história do Brasil sem o negro".
No Enem 2024, milhares de estudantes refletem sobre essas questões. Quem sabe, esta prova marque o início de uma transformação, não apenas no papel, mas na forma como enxergamos e valorizamos nossa própria história e herança.
Comments