Por Everton Montezi
Lembro que quando eu era adolescente, antes mesmo de ingressar no Ensino Médio, antes mesmo de se chamar Ensino Médio (na época era Segundo Grau), já comecei a ouvir sobre a importância de decidir a carreira que eu iria seguir quando adulto e a importância de cursar uma faculdade para tal. Minha família, embora não tenha me incentivado em nenhum momento a cursar uma graduação, mesmo assim, me levava a pensar no futuro profissional por meio de algum tipo de curso de especialização. Pobre rapaz, que não sabia que um dia ingressaria na faculdade tendo que equilibrar a vida de estudos com a vida de trabalho com a vida de cuidar de uma casa, pois já estava morando sozinho e se sustentando. Eram muitas vidas para equilibrar.
Aos trancos e barrancos, a graduação chegou ao fim, porém o cenário para a geração desse rapaz, que no caso, sou eu, a pessoa que vos escrevo nesse artigo, havia mudado drasticamente do início do Segundo Grau, agora chamado de Ensino Médio, até o fim da faculdade. De repente, uma geração que, em sua maioria, cresceu vendo seus pais conquistarem uma profissão que os proporcionou certa estabilidade para permanecerem em uma empresa por toda a vida, e se aposentarem por volta dos 60 anos ou menos, se viram inseridos em uma realidade completamente diferente. Exigências de formação cada vez maiores para salários cada vez mais baixos e a possibilidade de uma aposentadoria digna, cada vez mais distante.
A graduação passou a não ser mais um diferencial, mas praticamente requisito obrigatório, pelo menos estar cursando, e isso, diga-se para desempenhar funções técnicas e receber um salário não muito acima do salário mínimo, que nossos governantes juram que atende às necessidades básicas de uma família, afinal para nós, o proletariado, só o básico já está bom, não é mesmo?
Concursos públicos, que outrora garantiam melhores salários e estabilidade profissional, começaram a ficar cada vez mais escassos, sendo substituídos por contratados do governo vigente no momento, assim os contratantes podem oferecer salários menores e ter a garantia dos votos de seus contratados, que por medo de perderem seus empregos, os ajudam a se manterem no poder. Qual deve ser o sentimento um concursado que desbancou vários candidatos para conquistar uma tão sonhada vaga, quando percebe que para outros, bastou ser contratado por currículo por um político que só deseja garantir mais eleitores?
E aí aquele rapaz, que no caso de vocês terem esquecido, sou eu, e toda a sua geração que cresceu observando seus pais receberem o que pareceu ser o justo pelas suas conquistas, se viram todos sem saber o que fazer com suas graduações, ou se perguntando por que dedicaram tantos anos de suas vidas para a conclusão de algo que não vai proporcionar o diferencial e que vai ser tão mal remunerado. E pior, agora eles exigem sempre experiência para uma vaga de emprego. Aí aquele rapaz, que no caso sou eu, e toda a sua geração, os chamados de “geração Y” ou “millennials” (nascidos entre 1981 e 1996), se perguntam: “como ter experiência, se toda vaga requer experiência? Onde então eu consigo a primeira já que o estágio da faculdade e a formação em si não bastam? E o inglês que tive que fazer no cursinho para tentar ter um diferencial? Será que meu intercâmbio ajuda em alguma coisa nesse caso?”
Parece que não restou muita alternativa para essa geração do que se sujeitar a ingressarem em subempregos, enquanto observam uma geração que veio um pouco depois já estar se inserindo de forma bem mais natural nas tecnologias e novas modalidades de ganhar dinheiro, um dinheiro bem melhor, utilizando plataformas e redes sociais pelo celular. Acredita que dá para comprar até mansão fazendo dancinhas sem camisa na Internet? E agora o número que importa não é mais da nota que se tira na prova ou do seu CR, é número de seguidores. O mil agora virou K, e quanto mais Ks você tiver, mais você vale, mais te pagam, mais você ganha para mostrar o que os outros devem trabalhar subempregados para conseguir comprar. Mas, espera! K não era o símbolo de Potássio na tabela periódica? A gente não usava também para representar quilo? Foi isso que os millennials aprenderam na escola. Inclusive falaram para eles que deveriam prestar atenção e aprender para ser alguém na vida. Alguém quem?
O que aconteceu? Eles estavam dormindo? Não! Eles estavam trabalhando, fazendo faculdade e cursinho de Inglês. Alguns ainda continuaram com Mestrado e Doutorado e seguem continuando, continuam estudando, buscando se aproximar do reconhecimento profissional que a geração que ganha muito dinheiro na plataforma tem. Será que eles conseguem?
Bem, parece que enquanto eles estavam ocupados estudando para conquistar um futuro melhor, assim como fizeram os seus pais, um outro futuro chegou e eles não viram. Agora tem um monte deles tentando correr atrás do prejuízo, uns com sucesso, outros ainda não, mas… quem sabe no futuro? E ainda outros, seguem perdidos, esgotados, frustrados, só querendo mesmo ter algum reconhecimento por todo esforço que fizeram para concluir a faculdade e ter uma profissão e ser alguém na vida, blá blá blá... como os professores e os mais velhos ensinaram. São uma geração de fodidos. Miraram no sucesso e acertaram no Bornout. Estão cada vez mais forçados a empreender para não terem que se sujeitar às excessivas cargas horárias e acúmulo de funções, somadas às diversas formas de humilhações e abusos morais de seus gestores e empregadores. É, não está nada fácil para essa geração. Enquanto ela plantava o que acreditava ser seu futuro, foi atropelada pela geração posterior, que já nasceu se preparando para o digital.
Os tempos são outros! O trabalho que era feito por um jornalista que dedicou anos da vida estudando para desempenhar sua função, em alguns momentos é substituído por um influencer. O ator que estudava e passava anos fazendo teatro na esperança de ser visto por um diretor que o levasse para protagonizar a novela das nove agora atua como coadjuvante para uma “atriz” recém-saída do BBB, que só precisou chamar a atenção lá dentro, seja pela beleza ou pela quantidade de engajamento que gerou para o programa, os “Ks”, lembra? Aula de canto? Estudar e entender de música? Isso não é mais necessário. Sucesso se faz quando a batida é contagiante e cai no gosto popular. Vira cantor, ganha milhões. Ah, e é sempre bom lembrar de incluir o verbo “sentar” nas letras das músicas. É quase que requisito para aprovação popular. É sucesso na certa!
E assim a geração millennial coexiste entre duas gerações, uma que veio antes, estudou numa época em que o estudo ainda fazia alguma diferença, trabalhou e conseguiu se aposentar com um pouco ainda de saúde física e mental para curtir sua aposentadoria e cuidar dos filhos dos millennials enquanto eles trabalham. A outra, uma geração que já sabe o que tem que fazer para dar certo lá na frente, e que já estão dando certo agora!
Carreiras e diplomas sucateados! Substituídos por plataformas e conteúdos, em sua maioria, que nada tem a acrescentar positivamente; na verdade, prestam um desserviço para a população, para a geração que já espera tudo pronto, e que tem tudo pronto apenas com um clique. Que daqui a algum tempo, nem precisará mais ter inteligência, pois até isso foi desenvolvido para eles de forma artificial para fazerem as coisas.
O presente que hoje existe, que chamam de progresso, e o futuro que estão construindo, foi sucateando tudo que foi construído por uma geração no passado. Está tudo sucateado!!!
Que texto sensacional! Parabéns por retratar tão bem a realidade!
Enquanto a carga neoliberal estiver atirando a situação só tende a piorar. Esse sucateamento de tudo só existe para criar mercado para privatizações e aumento de lucros. Cada serviço ruim, diploma desvalorizado e piora na qualidade de vida gera lucros exorbitantes para grupos específicos. Terrenos e casas inacessíveis são lucros pra imobiliárias e construtoras. Faculdades públicas inacessíveis e cada vez mais sucateadas são criação de mercado e lucro para empresas do ramo da educação. E o mesmo vale para a saúde pública que quando esmagada pela depreciação gera clientes desesperados para planos de saúde caros e ruins. Nossa economia não é guiada para atender necessidades, é guiada somente para gerar lucro sem limite. Até os poucos casos de ascensão sã…
Muito Real que a vida adulta dos nossos pais foi muito mais fácil. Eu tenho uma profissão... mas foi às custas de muito estudo e preparação... foram muitos concursos CLT que eu passei e corri atrás. O mercado está cruel e quem trabalha nas profissões comuns não faz dinheiro... é difícil...