Presidente do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Fala Sobre Transformações e Projetos Inovadores
Por Ana Soáres.
História de Clara Paulino
Desde a infância, Clara Paulino nutria o desejo de ser historiadora, uma curiosidade que a acompanhou desde os seis ou sete anos. Apesar de sua aptidão e desempenho acadêmico, seus pais inicialmente torciam para que ela escolhesse uma carreira tradicional, como Direito ou Medicina. No entanto, Clara persistiu em seu sonho de estudar história, inspirada pela vontade de entender a origem de sua família e suas raízes.
Ao ingressar na primeira turma de História da UniRio, ela começou sua jornada acadêmica. Além dos estudos, Clara iniciou sua carreira dando aulas em pré-vestibulares. Seu primeiro contato profissional com a preservação do patrimônio ocorreu durante estágio na prefeitura do Rio de Janeiro, no departamento de patrimônio cultural.
Após formar-se, Clara seguiu para Quissamã, onde trabalhou na preservação de patrimônios relacionados à cultura da cana de açúcar. Sua atuação incluiu a recuperação de diversos locais, contribuindo para a preservação da história da região.
Ao longo dos anos, Clara passou por diferentes desafios e posições. Trabalhou na Central Única das Favelas, no escritório técnico do Iphan em São Pedro da Aldeia, e no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), onde atuou por quatro anos, chegando à chefia de gabinete e responsabilidade pela preservação do patrimônio ferroviário.
Crédito: Daniel A. Rodrigues
Durante sua trajetória, Clara também fez mestrado em Museologia e Patrimônio, aprimorando suas habilidades e conhecimentos. Em 7 anos de trabalho no governo do estado do Rio de Janeiro, passou por diferentes funções, chegando à presidência do Museu da Imagem e do Som (MIS).
Paulino enfrentou um novo desafio ao ser convidada para trabalhar no Theatro Municipal, onde assumiu a coordenação de unidade museológica. Mesmo sem familiaridade inicial com as linguagens artísticas do teatro, Clara demonstrou sua capacidade de adaptação e liderança, buscando revitalizar a instituição.
Seu trabalho focou não apenas na retomada da programação do teatro, mas também em fortalecer o vínculo com o público e valorizar os funcionários da instituição. Em meio à pandemia, ela enfrentou desafios administrativos, regularizando contratos e superando defasagens.
Em outubro de 2021, Clara conseguiu realizar o primeiro espetáculo no Teatro Municipal, marcando a retomada cultural do espaço. Seu comprometimento e paixão pela preservação do patrimônio cultural refletem uma trajetória marcada por desafios, conquistas e contribuições significativas para a cultura no estado do Rio de Janeiro.
Em entrevista dada à Ana Soáres Clara Paulino conta como está trilhando o caminho da Cultura no Estado do Rio de Janeiro
Ana Soáres: Clara, é um prazer estar com você para falar sobre as mudanças e inovações que você tem implementado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Podemos começar falando sobre o desafio inicial que você encontrou ao assumir a direção?
Clara Paulino: Certamente. Quando cheguei ao Theatro Municipal em janeiro de 2021, encontrei a instituição em uma situação desafiadora. Era necessário não apenas retomar a programação, mas também criar uma visão mais acessível e inclusiva para o teatro. Havia uma percepção, tanto interna quanto externa, de que o teatro era um espaço elitizado, e isso era algo que queríamos mudar.
Ana Soáres: Como você abordou esse desafio?
Clara Paulino: Nos primeiros meses, fiz um mapeamento completo da instituição, identificando pontos fortes e áreas a serem melhoradas. Fiz questão de envolver toda a equipe nesse processo, desde diretores até os responsáveis pelos diversos corpos do teatro. O objetivo era entender onde estávamos pisando e, a partir disso, criar estratégias para a retomada.
Ana Soáres: Pode falar um pouco mais sobre as primeiras ações que tomou?
Clara Paulino: Certamente. Optamos por uma retomada gradual da programação, começando com visitas guiadas para envolver o público e compreender suas reações. Essa interação nos mostrou que havia uma demanda reprimida e que as pessoas estavam ávidas por mais eventos no teatro. Ao mesmo tempo, trabalhamos na regularização administrativa da casa, resolvendo questões contratuais e deficiências estruturais.
Ana Soáres: E como foi o retorno efetivo das apresentações?
Clara Paulino: Em outubro de 2021, conseguimos realizar o primeiro espetáculo com uma capacidade reduzida, seguindo todas as medidas de segurança. Foi um termômetro positivo, o que nos encorajou a aumentar gradativamente a quantidade de público. Foi gratificante perceber que o teatro poderia ser um espaço acessível a todos os públicos.
Ana Soáres: Além da programação, você mencionou a criação de um projeto mais amplo. Pode compartilhar mais detalhes sobre isso?
Clara Paulino: Claro. O projeto que elaboramos tem como foco não apenas a programação, mas também a acessibilidade financeira. Reduzimos os custos dos ingressos, tornando-os mais acessíveis. Agora, temos espetáculos produzidos pela própria casa para todos os valores, desde R$ 7,50 até R$ 100,00. Queremos que o Theatro Municipal seja um espaço democrático, onde todos sintam-se bem-vindos.
Ana Soáres: Como você enxerga o papel do Theatro Municipal na sociedade?
Clara Paulino: Vejo o Theatro Municipal não apenas como um espaço artístico, mas como um patrimônio nacional que pertence à população. É um local onde a cultura e as artes devem estar ao alcance de todos. Queremos desmistificar a ideia de que é um espaço elitizado, mostrando que ele é um palco para diversas expressões artísticas.
Ana Soáres: E como você pretende continuar essa jornada?
Clara Paulino: A programação para o próximo ano já está em andamento, e continuaremos a promover espetáculos de qualidade, produzidos tanto pela casa quanto por artistas renomados. Além disso, manteremos o compromisso com a acessibilidade, buscando sempre novas formas de envolver o público e fazer do Theatro Municipal um espaço cada vez mais inclusivo.
Ana Soáres: Fale-nos sobre a sua visão e abordagem ao liderar uma instituição tão emblemática.
Clara Paulino: Ao entrar nessa jornada, meu principal foco foi valorizar não apenas os espetáculos, mas também todos os profissionais envolvidos, desde técnicos até os artistas. Acredito na importância de destacar a riqueza cultural e histórica dessa instituição.
Ana Soáres: Com uma equipe tão diversificada e extensa, como você tem enfrentado os desafios de manter o Theatro Municipal ativo e inovador?
Clara Paulino: É um desafio, sem dúvida, mas fundamental para o sucesso da instituição. Criamos uma programação anual que busca expandir nossas apresentações, indo além das tradicionais óperas e balés. Além disso, buscamos patrocínios para garantir que nossos espetáculos continuem sendo de alta qualidade. A parceria com a Petrobras tem sido crucial nesse processo.
Ana Soáres: É interessante notar a diversidade de projetos que você mencionou, desde exposições até iniciativas educacionais. Como essas atividades se conectam à missão do Theatro Municipal?
Clara Paulino: Todas essas iniciativas têm o objetivo de democratizar o acesso à cultura. Queremos que o Theatro seja um espaço para todos, independentemente de sua origem ou classe social. Projetos como o Boulevard de Portas Abertas, as exposições itinerantes e parcerias com universidades buscam quebrar barreiras e tornar o teatro um lugar acolhedor para todos.
Ana Soáres: Falando em acesso à cultura, o projeto Escola é fascinante. Como surgiu a ideia e quais os impactos percebidos até agora?
Clara Paulino: O projeto Escola surgiu da necessidade de aproximar os jovens da cultura, especialmente aqueles que talvez nunca tivessem tido a oportunidade de frequentar um teatro. A resposta tem sido incrível. Não apenas aumentamos a frequência de jovens nas apresentações, mas também observamos um interesse crescente e uma maior compreensão do universo teatral.
Ana Soáres: E sobre a internacionalização, como essa estratégia tem contribuído para a projeção do Theatro Municipal no cenário global?
Clara Paulino: A internacionalização é uma extensão natural de nosso compromisso em levar a cultura brasileira para além de nossas fronteiras. Participar de festivais em cidades como Milão e Madri não apenas promove nossos artistas, mas também coloca o Theatro no mapa internacional. Além disso, essas experiências têm proporcionado um intercâmbio valioso de conhecimento e práticas.
Ana Soáres: Mudando um pouco de foco, gostaria de ouvir mais sobre as temáticas sociais abordadas nos espetáculos. Como você enxerga o papel do Theatro Municipal na discussão de questões como raça, gênero e violência doméstica?
Clara Paulino: Acredito que o teatro tem a responsabilidade de refletir e abordar as questões contemporâneas. Em nossas produções, buscamos incorporar narrativas que estimulem a reflexão sobre temas importantes, como feminicídio, invisibilidade feminina e questões raciais. Queremos não apenas entreter, mas também provocar diálogos significativos.
Ana Soáres: Com todas essas iniciativas em andamento, quais são as perspectivas para o futuro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro?
Clara Paulino: Nosso futuro é empolgante. Queremos continuar inovando, ampliando nosso alcance e proporcionando experiências culturais enriquecedoras. A pandemia nos desafiou, mas também abriu espaço para repensar a forma como nos conectamos com o público. Estamos comprometidos em manter o Theatro como um ponto central da cultura carioca e brasileira.
Ana Soáres: Clara, agradeço muito pela sua disponibilidade e por compartilhar conosco as fascinantes transformações que estão ocorrendo no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Desejamos muito sucesso em todas as suas iniciativas futuras.
Clara Paulino: Obrigada pelo espaço e pelo interesse. Estamos aqui para enriquecer a vida cultural da nossa cidade e do nosso país. Contamos com o apoio a participação de toda a comunidade para continuarmos essa jornada emocionante.
Muito dessa transformação se deve ao apoio incansável da Petrobras que está presente valorizando o potencial do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, construindo um legado há mais de 20 anos. Em 2023, a Petrobras se tornou a patrocinadora oficial do Theatro Municipal. Neste mesmo ano, em outubro, a empresa comemorou 70 anos de história!
Ana Soáres
O projeto escola do TMRJ foi criado em 1982 pela diretora Dalal Aschar. As pessoas no Brasil esquecem a história e os verdadeiros criadores de alguns projetos importantes para o país.