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Marcelo Teixeira

Educar é frustrar


Criança chorando

Fui filho de pais que trabalhavam fora e adquiriram casa própria por meio de financiamento bancário. Estudei em escola pública, paguei a faculdades do meu próprio bolso e estou na luta até hoje. Meu pai e minha mãe (e também tios e avós) educaram a mim e a meu irmão na base da disciplina. Nem sempre puderam dar tudo com o que sonhávamos, mas sempre conversavam conosco e estabeleciam limites dentro da nossa realidade.


Talvez por isso, não me lembro de birras homéricas que tenhamos feito para conseguir algum brinquedo ou privilégio como sentar à janelinha do avião. Mesmo porque, só fui andar de avião já adulto. Minha mãe e uma tia estavam comigo, aliás. Já com meu pai, não tive esse privilégio.


Estou dizendo isso tudo porque, desde menino, ficava abismado em ver crianças menores que eu dando verdadeiros shows quando eram contrariadas. Era um tal de abrir o berreiro; se jogar no chão; se agarrar nas pernas de pai, mãe ou avó na busca desesperada por um brinquedo, sorvete ou similar. Olhava a cena e pensava, com os meus botões: – Ah, se fosse meu filho!

           

Não me casei, tampouco tive filhos. Ajudei, no entanto, a criar dois sobrinhos. Como nunca fomos de dar mole, ambos cresceram sabendo dos limites que havia e nunca foram de dar espetáculos. Se porventura dessem, lá estávamos nós, com firmeza amorosa, falando para engolirem o choro e se conformar. Era assim que meus pais agiam. Amo e sempre amarei meus pais da mesma forma que meus sobrinhos me amam. Afinal, como diz o título deste artigo, educar é frustrar.

           

A criança precisa de limites. Melhor dizendo, a criança quer limites. E ninguém precisa ser mestre em pedagogia ou educação para chegar a essa conclusão tão óbvia. Estabelecer limites para as crianças é fazê-las perceber que não é fácil terem tudo o que desejam. E aí entra não só a questão financeira (nem sempre podemos comprar tudo com o que sonhamos ou com o que elas sonham) como também a questão filosófica: as crianças irão crescer, entrar no mundo dos adultos e experimentar inúmeras frustrações. O mundo raramente dará tudo o que elas querem. Virão os nãos dos professores, do mercado de trabalho, da fila do check-in, do restaurante lotado, dos parceiros afetivos e sexuais... E convém lembrar que, por mais que os pais passem a mão por cima dos melindres e deem tudo que os filhos querem, nem sempre eles estarão por perto na hora que os rebentos passarem por algum baque afetivo, financeiro ou profissional.


Sim, os meninos e meninas que adoram fazer birra porque querem sentar perto da janelinha irão crescer. E seus papais e mamães podem estar à léguas de distância para acusar de pouco empáticos aqueles que ousaram dizer não. Alguns papais e mamães, inclusive, terão o azar de morrer bem antes do que pensam e deixarão no mundo filhos chatos, arrogantes, infantilizados, ciumentos, mimados, egoístas e inseguros. Crianças em corpos de adultos que darão um trabalho danado a colegas de trabalho, vizinhos, cônjuges e, por conseguinte, apanharão muito do mundo para aprenderem a crescer e aparecer.


Por isso, se você tem ou pretende ter filhos, tenha em mente desde já que, em muitas (mas muitas) ocasiões, será necessário frustrá-los para que eles cresçam emocionalmente estáveis. A não ser que você queira ver homens e mulheres feitas dando shows de grosseria em espaços públicos, o que é constrangedor para eles e para quem presencia.


Eduque e frustre!


Marcelo Teixeira

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