Cega e pioneira no humor, Tatá expõe abuso sofrido no palco e destaca luta contra o preconceito e a impunidade
Por Silver D'Madriaga Marraz
Tatá Mendonça, também conhecida como "Cega na Comédia", apresentou uma queixa contra seu colega Cadu Moura por importunação sexual durante um show de stand-up em São Paulo. Uma gravação nas redes sociais mostra Cadu colocando a mão nas costas de Tatá e descendo até suas nádegas, o que faz Tatá afastar a mão imediatamente.
Tatá, que é deficiente visual, comentou o caso em seu Instagram, no qual possui 667 mil seguidores: “Pra variar, assédio... Sofri um assédio no palco. Ele era meu editor, supostamente. O dinheiro que eu pagava pra você, eu tirava, muitas vezes, da minha boca, porque eu sabia onde eu tinha potencial para chegar.”
A comediante explicou que ficou em choque e ressaltou a importância de expor essas situações: “Na hora, realmente fiquei chocada. É surreal, eu não estou acostumada, de nenhuma forma, a ser exposta desse jeito. Fico muito feliz que tenha o vídeo. Surtei porque achei que não ia ter vídeo, aí é difícil, porque eu não ia querer me expor.”
Tatá também abordou as dificuldades de ser uma mulher cega no meio humorístico, destacando o preconceito e a falta de apoio que enfrenta. “Eu sou cega, não tinha R$ 1 quando comecei. Tenho filho pra sustentar. Você foi abraçado pela cena, enxergando...”
A Polícia Civil instaurou um inquérito e investiga o caso como importunação sexual. Tatá reforçou que, apesar do ocorrido, continuará sua carreira e agradeceu ao público pelo apoio: “Deus é maravilhoso. Eu não vou deixar de trabalhar, não vou deixar de levantar minha cabeça.”
Cadu Moura desativou suas redes sociais e não se pronunciou publicamente sobre o caso até o momento.
Casos e descaso e a lei em relação ao fato
A Lei no 13.718/2018, que combate a importunação sexual no Brasil, estabeleceu penas mais severas para esse tipo de crime, mas os importunadores sexuais continuam dispostos a cometer esse tipo de crime. Antes dessa legislação, muitos atos que agora são considerados importunação sexual eram considerados insignificantes. Além de aplicar punições diretas aos infratores, a nova lei tem como objetivo prevenir a propagação da cultura de assédio e promover o respeito ao espaço e à integridade física de todas as pessoas. Mesmo com esse avanço, a aplicação eficaz da lei continua a ser difícil. Muitos profissionais da área jurídica dizem que o sistema judiciário e as forças de segurança precisam ser mais treinados para lidar com esses casos, além da necessidade de um maior apoio às vítimas durante todo o processo.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2023, o Brasil registrou mais de 41 mil ocorrências de importunação sexual, um aumento de 48% em relação ao ano anterior. Esse aumento mostra tanto uma maior conscientização das vítimas, um maior incentivo à denúncia e a persistência desse tipo de crime em vários contextos sociais, como transporte público, locais de trabalho e locais de lazer.
Os números em São Paulo são ainda mais preocupantes. Os registros de importunação sexual no estado aumentaram de 6.215 em 2022 para 13.808 em 2023. A maioria desse aumento é atribuída pelas autoridades à maior procura de vítimas por delegacias. No entanto, a criminalização desse comportamento em 2018 ainda enfrenta problemas importantes, como a cultura do silêncio e brechas legais, que permitem que muitos agressores escapem de punições severas.
Vale lembrar alguns casos:
Silvio Almeida (2024) - O ex-ministro dos Direitos Humanos do Brasil foi acusado de importunação sexual por ex-alunas durante sua atuação como professor. As denúncias estão sendo investigadas pela Polícia Civil de São Paulo, após relato de uma das vítimas, a professora Isabel Rodrigues, que o acusou de ter cometido o ato em um almoço.
Caso de Fortaleza (CE) (2023) - Em Fortaleza, um incidente de importunação sexual no transporte público chamou atenção, levando a um aumento das discussões sobre a segurança das mulheres em espaços públicos e a importância de denúncias rápidas e adequadas.
Casos em transporte público - Em várias cidades, especialmente em São Paulo e Rio de Janeiro, houve um crescimento de denúncias de importunação sexual em ônibus e metrôs. Isso inclui uma série de casos relatados por mulheres que enfrentaram toques indesejados em veículos superlotados.
Giovanna Ewbank - Em 2023, a atriz relatou ter sido vítima de importunação sexual em um ambiente público, gerando grande repercussão e levantando debates sobre a vulnerabilidade de figuras públicas e mulheres em geral.
Clara Aguilar - Ex-participante do Big Brother Brasil, Clara Aguilar também se manifestou nas redes sociais em 2023, denunciando um episódio de importunação sexual que sofreu em um evento de entretenimento.
Mulher não identificada em ônibus no DF - Em abril de 2023, um vídeo viralizou nas redes sociais mostrando uma mulher sendo vítima de importunação sexual em um ônibus de Brasília. A denúncia foi amplamente repercutida e levou a discussões sobre a segurança no transporte público.
Letícia Sabatella - A atriz denunciou ter sido vítima de assédio e importunação sexual em 2023, quando um homem invadiu um espaço público e fez comentários inapropriados, reforçando a necessidade de punições mais severas para agressores.
Mulher vítima em festa em São Paulo - Durante uma festividade em São Paulo em 2023, uma mulher denunciou ter sido importunada por um participante, o que gerou repercussão nas redes sociais e nas campanhas feministas locais.
Transporte público no Rio de Janeiro - Um caso em 2023 no metrô do Rio de Janeiro chamou atenção quando uma mulher foi vítima de importunação sexual e o agressor foi contido por outros passageiros até a chegada da polícia.
Casos em shows e festivais - Em 2023, vários festivais de música tiveram relatos de mulheres sendo vítimas de importunação sexual, gerando movimentações de ativistas para medidas de proteção nesses eventos.
Caso na Avenida Paulista, São Paulo - Em 2024, uma mulher foi importunada enquanto caminhava pela Avenida Paulista. Ela filmou o agressor e o vídeo viralizou, levando à sua prisão temporária e um debate sobre a segurança em vias públicas movimentadas.
Mulheres em blocos de Carnaval no Rio - Durante o Carnaval de 2024, várias mulheres denunciaram terem sido vítimas de importunação sexual em blocos de rua, aumentando a pressão sobre autoridades para mais segurança em eventos de grande porte.
Vítima LGBTQIA+ em boate de Salvador - Em 2024, uma pessoa da comunidade LGBTQIA+ relatou ter sofrido importunação sexual em uma boate de Salvador, destacando que esses crimes não estão limitados a um gênero específico e que a discriminação também faz parte do contexto.
O contexto brasileiro
Qualquer ato libidinoso praticado contra alguém sem seu consentimento com o objetivo de satisfazer o desejo sexual de quem o comete é considerado importunação sexual. Trata-se de um crime que afeta tanto mulheres quanto homens, mas os dados mostram que as mulheres são as vítimas mais comuns, principalmente em ambientes públicos como transporte, festas e lugares de trabalho. Os especialistas em segurança pública dizem que a subnotificação continua sendo um problema sério, apesar da crescente conscientização sobre o assunto. Acredita-se que muitos casos não sejam relatados por medo, vergonha ou desconfiança nas instituições, o que significa que os números oficiais podem ser apenas um aspecto da realidade.
A importunação sexual tem um efeito devastador nas vítimas. Além do trauma psicológico imediato, muitas pessoas que enfrentam esse tipo de violência relatam sequelas emocionais prolongadas que afetam sua confiança, autoestima e relacionamentos pessoais. Por exemplo, as vítimas de assédio no local de trabalho podem desenvolver sintomas de ansiedade, depressão e, às vezes, abandonar o trabalho para fugir da convivência com o agressor. A importunação sexual também causa danos indiretos à sociedade porque perpetua uma cultura de desrespeito ao consentimento e à dignidade alheia, prejudicando as relações humanas em geral.
Diante do número crescente de casos, a sociedade civil tem desempenhado um papel importante na luta contra a importunação sexual. Organizações não governamentais (ONGs), movimentos feministas e grupos de defesa dos direitos humanos têm se esforçado arduamente para fornecer informações sobre o assunto e fornecer assistência às vítimas. Além de fornecer apoio jurídico e psicológico, muitas dessas entidades pressionam o governo para implementar políticas públicas mais eficazes.
Para mudar o cenário atual, são usadas estratégias como campanhas de conscientização, palestras em escolas e universidades e fortalecimento das redes de apoio às vítimas. Em algumas cidades brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro, foram lançadas campanhas específicas nos serviços de transporte público para encorajar os passageiros a denunciar casos de importunação sexual e fornecer conselhos sobre como agir em casos de assédio.
Vale ressaltar que combater a importunação sexual é um desafio tanto moral quanto legal em um país onde a violência sexual ainda é um fato cotidiano. Embora a Lei no 13.718/2018 tenha feito avanços significativos, ainda há muito a ser feito para garantir que todos se sintam seguros e respeitados em seus locais de residência. A conscientização pública, a educação e a atuação eficaz das autoridades são necessárias para que, como sociedade, possamos combater a violência desse tipo. É imperativo que todos os setores da sociedade se unam para enfrentar esse problema de maneira compassiva e eficaz, enquanto se busca justiça para as vítimas e se promove uma cultura de igualdade e respeito. O corpo do outro e seu consentimento é um valor inegociável.
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