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Renata Freitas

A alfaiataria como regra no ambiente de trabalho: Elegância ou falta de subjetividade

Alfaiataria

Começo este texto com uma explicação: aqui estou apenas refletindo sobre possibilidades conceituais de um movimento crescente, principalmente nas redes sociais. Não há nenhuma afirmação categórica. Apenas uma evocação para pensarmos juntos, como continuação do que tratei na última coluna. Eis a questão central e seus desdobramentos:

Como a estética do estilo elegante que nos é vendido hoje, com peças de alfaiataria em tons claros, monocromáticos, é utilizada para elevar o valor dos discursos e vendas na internet e em ambientes de trabalho, com a ideia de profissionalismo. Funciona porque cria uma ideia de autoridade no imaginário popular, esbarrando no complexo de inferioridade provocado pelo colonialismo em que tais peças são importadas, de luxo, caras, distantes da realidade brasileira, que vêm de fora. Por isso, pode trazer soluções que não conseguimos encontrar sozinhos, esperando novamente a salvação do colonizador?

Importamos a ideia de produtividade europeia, a estética de um continente que nada tem a ver com a nossa formação como povo, apenas a subjugação. Como país que passou por um violento processo de colonização, recém-liberto, ainda em recuperação e reconstrução de sua própria história, essa importação cultural é muito perigosa. Lá no Velho Continente, já se discute a possibilidade de diminuir ainda mais a carga horária de trabalho, com foco na qualidade de vida, já muito superior à nossa. Aqui, começamos agora esse movimento reflexivo de questionar a carga horária e condições de trabalho beirando os moldes escravocratas. Tratarei, hoje, sobre a relação dos códigos de vestimenta e os movimentos nas redes sociais, nosso novo escritório coletivo, de muitos coaches e consultoras de imagem vendendo o poder mágico de uma imagem elegante.

Basta olhar nas ruas, onde a verdadeira moda acontece em movimento: pessoas não se vestem de alfaiatarias, roupas sociais, ternos e gravatas apenas a caminho do trabalho. Por que, no ambiente de trabalho, precisamos performar essa estética visando ao profissionalismo, que atenda às exigências do capital? Ou para agradar os patrões da colônia? A ideia de globalização imposta pelo capitalismo estrangeiro nos informa que nossa forma de produtividade não é suficiente, assim como nossa estética. Precisamos parecer outros, à imagem e semelhança do padrão eurocêntrico, para justificar nosso valor. Não é assim que internalizamos nosso complexo de inferioridade? Diferenciando a imagem pessoal, inferior brasileira do cotidiano, da imagem profissional autoritária e alinhada? A neutralidade de cores, texturas e modelagens como para dar lugar à racionalidade focada na produção, no lucro? As cores, a diversidade de tecidos, texturas e modelagens distraem. Sejamos uniformizados e padronizados. Mas, é claro, estamos pensando aqui nos cargos mais altos e executivos. Para as classes não dominantes, operacionais, a estética é a bagunça, o desleixo. Não há necessidade de impor valor por códigos de vestimenta sofisticados. Por isso, a importância da diferenciação: o meu uniforme vem de fora. Mesmo que até as condições climáticas de um país tropical indiquem outra forma de se vestir.

Aqui, ainda vemos a dependência presente em nosso imaginário e simbólico, mais uma vez o apagamento sistemático de nossa riqueza cultural.

Pensemos agora nos modos de produção encontrados pelos primeiros colonizadores: o escambo era o meio de troca de objetos, em que o valor dessa troca era a necessidade. Oferecia-se o que se tinha pelo que se precisava, sem acumulações; a produção era coletiva de todos para todos. Chega, então, a febre do ouro europeia, trazendo para a nova terra descoberta as noções de guerra por bens materiais de valor acumulativo, escravidão e divisão de classes por capacidade produtiva intelectual e operacional. Muitos para servir e produzir, alguns para reter e usufruir.

A estética colonial euro centrada foi atualizada, mas há, ainda, a noção de divisão de códigos de vestimenta entre nobres e plebeus. Aos nobres, tecidos finos, fios de ouro, joias em processos de produção exclusivos e minuciosos; ao povo, trapos velhos de qualidade duvidosa, sobras de produção em processos industriais de massa, totalmente insustentáveis.

Trago uma questão sobre a qual não havia pensado anteriormente, mas que fez sentido como uma possível conclusão. Podemos entender que, hoje, essa representação de uma divisão simbólica e estética dos códigos de vestimenta se encontra nas grandes casas de alta costura, aos nobres e, ao povo, as grandes marcas de produção em massa, como as fast fashions? Cabe ainda uma indagação: a adoção da alfaiataria e das roupas sociais neutras e monocromáticas adotadas por aqui pelas classes produtivas como status de autoridade, elegância e superioridade são uma tentativa de aproximação da nobreza mas, na verdade, estamos inconscientemente assumindo mais uma vez o lugar de escravizados modernos?

Remontando a um tempo de códigos de vestimenta claríssimos: a exuberância das cores, texturas e camadas pertenciam aos reis e rainhas; aos escravizados e pessoas comuns só era permitida a modéstia dos trapos em cores claras e uniformes, sem qualquer vestígio de subjetividade, apenas a utilidade de vestir os corpos. Se pudermos chegar à essa conclusão com alguma segurança, a única saída subversiva é valorizar cada vez mais nossa estética riquíssima genuinamente brasileira, digna de realeza, em sua pluralidade subjetiva.

Renata Freitas




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